Por Fábio Ferreira de Moura (OAB/SP 155.678) e Camila Ferreira de Moura (OAB/SP 206.402)
Ferreira de Moura e Boaretto Advogados Associados
Quando falamos em impenhorabilidade das quotas-partes das cooperativas, estamos dizendo da impossibilidade de se utilizar as quotas-partes para garantir ou saldar dívidas ajuizadas.
Nesse sentido, a Lei Complementar 196/2022 (Altera a Lei Complementar nº 130, de 17 de abril de 2009 (Lei do Sistema Nacional de Crédito Cooperativo), de forma taxativa e clara incluiu ao artigo 10 o §1 º dispondo sobre a impenhorabilidade das quotas-partes do capital social da cooperativas:
“Art. 10. A restituição de quotas de capital depende, inclusive, da observância dos limites de patrimônio exigíveis na forma da regulamentação vigente, e a devolução parcial é condicionada ainda à autorização específica do conselho de administração ou, na sua ausência, da diretoria executiva.
§ 1º São impenhoráveis as quotas-partes do capital de cooperativa de crédito.
§ 2º Enquanto a restituição permanecer não exigível por inobservância dos limites referidos no caput deste artigo, as quotas de capital permanecerão registradas em contas de patrimônio líquido da cooperativa.” (NR)
Taxatividade essa de suma importância, que põe fim a discussão nos Tribunais quanto a possibilidade de penhorabilidade das quotas-partes, trazendo segurança jurídica, econômica e de própria existência as Cooperativas.
Isso porque, enquanto não existia a taxatividade quanto a impenhorabilidade, os Tribunais brasileiros baseavam-se suas decisões nos seguintes termos de lei:
Art. 789. O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei. (Código de Processo Civil)
E com a taxatividade da impenhorabilidade, o ordenamento jurídico dispõe que:
Art. 832.Não estão sujeitos à execução os bens que a lei considera impenhoráveis ou inalienáveis. (Código de Processo Civil)
Dessa maneira, juridicamente, o tema encontra-se sedimentado, proibindo a utilização das quotas-partes para garantir ou saldar dívidas ajuizadas, vulgo impenhorabilidade das mesmas, sem qualquer omissão que possa ensejar divergência de interpretação.
Porém continuando o raciocínio acima exposto, qual a importância dessa taxatividade de impenhorabilidade das quotas-partes no âmbito financeiro e existencial das Cooperativas?
A principio, de acordo com a Lei 5.767/71 que institui o regime jurídico das sociedades cooperativas, e dá outras providências, as cooperativas possuem categoria jurídica própria e autônoma, não podendo serem comparadas em seu proceder com nenhuma outra sociedade, muito menos com as instituições financeiras apesar de no caso das cooperativas de crédito prestarem serviço de natureza financeira equiparadas às instituições financeiras pelo fato de seu funcionamento depender de prévia autorização do Banco Central do Brasil:
Art. 4º As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados, distinguindo-se das demais sociedades pelas seguintes características..( Lei 5.767/71).
Em relação as cooperativas de crédito, essas têm por objetivo fomentar as atividades do cooperado via assistência creditícia.
Sendo ato próprio de uma cooperativa de crédito a captação de recursos, a realização de empréstimos aos cooperados bem como a efetivação de aplicações financeiras no mercado, o que propicia melhores condições de financiamento aos associados, submetidas à Lei Complementar 130/2009, bem como à legislação do Sistema Financeiro Nacional – SFN e das sociedades cooperativas.
A captação de recursos e a concessão de créditos e garantias devem ser restritas aos associados, ressalvadas as operações realizadas com outras instituições financeiras e os recursos obtidos de pessoas jurídicas, em caráter eventual, a taxas favorecidas ou isentos de remuneração.
Portanto, a finalidade da Cooperativa de Crédito em sua essência não é o enriquecimento e sim a associação e união de pessoas em busca de benefícios compartilhados, assim a quota-parte é parte constitutiva da cooperativa, patrimônio liquido e autônomo, e sua disponibilidade compulsória através de uma penhora, desencadeia a exclusão do executado associado da cooperativa, exclusão desta modalidade não prevista em lei ou estatuto, gerando um efeito colateral extrapatrimonial da execução civil, prejudicando a própria manutenção da cooperativa atingida assim por ato/divida da qual não faz parte.
E mais ainda, os saldos de capital, da remuneração de capital ou das sobras a pagar não procurados pelos associados demitidos, eliminados ou excluídos deverão ser destinados para o fundo de reserva da cooperativa de crédito, após cinco anos desse desligamento.
Em suma, as quotas-partes sempre foram intransferíveis a terceiros estranhos à sociedade, pois acarretam a exclusão indevida do cooperado e a redução dos recursos essências para o desenvolvimento dos objetos sociais das cooperativas, porém a Lei complementar 196/2022, traz definitivamente o encerramento das divergências jurisprudências, prezando por maior segurança e protagonismo ao segmento das Cooperativas de Crédito.